Crer sem pertencer: a “religião” do século XXI

Naiara Leão
3 min readJan 2, 2018

Buscar a Deus, mas rejeitar a igreja. Essa é a principal tendência religiosa da atualidade, segundo diversos sociólogos. O fenômeno de “believing without belonging” (traduzido como “crer sem pertencer”) representa pessoas que creem em Deus ou em algum tipo de ser superior e até buscam exercitar a espiritualidade individualmente, mas não querem se envolver com a religião organizada.

A prática religiosa caiu, em média, 51% entre 1970 e 2002 na União Europeia e em países como Argentina e Canadá, segundo dados organizados pelos historiadores britânicos Pippa Norris e Ronald Inglehart a partir de vários censos [os dados brasileiros são inconsistentes]. Isso, no entanto, não significa que mais pessoas estejam tornando-se ateias. A crença na vida após a morte, a leitura frequente de texto sagrado e a crença em uma divindade mantiveram-se altas, mostrando que há uma fé desvinculada da prática religiosa.

Os números reiteram o que estudiosos da religião já vêm observando há algum tempo. O termo “believing without belonging” foi cunhado nos anos 1980 pela socióloga Grace Davie para referir-se à prática desvinculada de uma instituição. O que é, segundo ela, é típico das sociedades seculares, ou seja, qualquer uma em que a religião não seja o centro da vida social, mas apenas uma das esferas dessa vida, junto ao Estado, à família, ao trabalho e tudo mais.

A reação das igrejas

A primeira vez em que ouvi falar em “crer sem pertencer” foi numa visita à uma igreja Metodista de Chicago, em 2015. O ministro advertia os fieis — a maioria afro-americanos, asiáticos e velhinhas do bairro — logo no domingo de manhã contra os perigos da individualidade da fé. “Qual a primeira coisa que um predador faz quando quer atacar uma ovelha? Ele a separa do bando.”

Ministros de diversas instituições religiosas declaram que o “crer sem pertencer” é um dos maiores desafios da atualidade. O próprio Vaticano já admitiu tê-lo no topo da sua pauta de discussões internas. “Enquanto mais e mais pessoas não tem problema algum com Jesus Cristo, elas o amam e o aceitam como seu Senhor e Salvador, elas, sim, tem problemas com a igreja”, disse o cardeal de Nova Iorque Timothy Dolan em entrevista à Reuters, em 2013.

Naiara Leão

Nomad. PhD student of Religion, early Christianity and Women's and Gender Studies. Follow my IG @academicanomad